quinta-feira, 27 de maio de 2010

EMÍLIO CONDE, O APÓSTOLO DA IMPRENSA PENTECOSTAL NO BRASIL

Jefferson Magno Costa

    Naquele edifício residencial no bairro de Santa Tereza, aquela janela acesa em um dos seus apartamentos; aquela lâmpada amarela que avança nítida no tempo, através das horas frias e silenciosas da noite, não representa a vigília angustiada de algum enfermo, nem a insônia de um coração intranquilo, ou o próprio guardião da madrugada a velar o sono das criaturas. Não.
     É apenas um homem que escreve, um trabalhador solitário que, sob o olhar terno e sereno de Cristo, prepara artigos para ser divulgados no meio evangélico. No final de cada um deles o leitor lerá as iniciais E.C. - Emílio Conde.
    Enquanto esse homem solitário escreve, sua fronte se ilumina em enlevos de visitação ao Céu; sua mente percorre "as ruas de ouro e cristal da formosa Jerusalém", e, sobre o papel, seu punho se agita, e a página branca, ao toque da tinta negra, torna-se mais branca ainda, alva como a neve, porque nela estão sendo escritas palavras pronunciadas na Cruz.
    Emílio Conde nasceu no dia 8 de outubro de 1901, em São Paulo. Seus pais, João Batista Conde e Maria Rosa eram de origem italiana.
    Consequentemente, o primeiro contato de Emílio com o Evangelho foi na Congregação Cristã do Brasil, fundada por italianos. Ali, o futuro escritor evangélico creu em Jesus Cristo e se tornou membro da igreja no dia 21 de abril de 1919, sendo em seguida batizado com o Espírito Santo.
     Transferindo-se para o Rio de Janeiro, passou a frequentar a Assembleia de Deus na Rua Figueira de Melo, 232, em São Cristóvão, pastoreada na época pelo missionário Samuel Nyströn.
     Entusiasmado com o calor espiritual dos que ali se reuniam para cultuar a Deus, Emílio Conde transferiu-se de sua denominação e tornou-se membro dessa igreja.
    Os anos que se sucederam foram empregados na busca incansável dos meios, os melhores que fossem, de agradar a Cristo. Era necessário servi-lo com toda integridade de coração e amplitude de espírito. E Emílio Conde passou a empregar as suas horas vagas no estudo e meditação dos conhecimentos bíblicos e humanos.
     Eram necessárias bases sólidas para a construção do edifício espiritual que iria surgir de suas mãos.
    Principiou pelo conhecimento de sua língua, e depois de dominá-la satisfatoriamente, passou ao aprendizado de outras.
      Aprendeu o italiano, o inglês e o francês, sendo-lhe assim fácil o acesso à literatura desses idiomas, tão ricos em livros de inspiração evangélica. Leu boas obras ainda não traduzidas para o português.
     Foi um perfeito autodidata. Sua curiosidade abrangia vários ramos da cultura humana. Cabe porém salientar que estas leituras não o desviaram da Bíblia, pois era do seu conhecimento que "por abundantes que sejam os regatos, mais agradável é beber na fonte".
     Deste modo, dia a dia ele perseverava na oração e na leitura da Palavra de Deus, fazendo grandes progressos nos caminhos do Espírito. Era costume seu isolar-se para meditar e sentir "a largura, o comprimento, a altura, e a profundidade do amor de Cristo que excede todo o entendimento" (Efésios 3.18,19).
    Aonde chegava, dava seu testemunho de crente. E assim, pela intensidade de vezes que subiu ao púlpito, sua palavra foi pouco a pouco se delineando, tomando feições amplas, tanto pela soma de conhecimentos que apresentava, como pelo evidente toque do Espírito.
     "Era agradável ouvi-lo" - disse um antigo pastor acerca do seu testemunho - "pois ele somava à unção espiritual e ao profundo conhecimento bíblico, uma vasta cultura secular".
    Em 1937, o missionário Nils Kastberg encontrou-o trabalhando como intérprete em um restaurante do Rio de Janeiro. A Casa Publicadora começava a surgir nesse ano.  "Irmão Conde, necessitamos de alguém para atender ao expediente da redação de nosso periódico, o 'Mensageiro da Paz'. Sabemos que o irmão reúne em si todas as qualificações necessárias para tal cargo. O irmão aceita ser nosso redator?"
     Surpreso, antevendo a intervenção divina que se sobressaía naquele convite tão simples, e sentindo-se tocado em um dos pontos fundamentais de sua vida, a sua vocação, ceitou. Era o amanhecer do ministério do apóstolo da imprensa evangélica pentecostal no Brasil.
    Emílio Conde tratou de reunir então todo o material que havia acumulado durante anos e anos de estudos e pesquisas. Seus livros, seus cadernos de notas, trechos extraídos de muitas leituras, comentários feitos às margens das páginas dos inúmeros volumes que lera, esboços de obras em fase de conclusão, e, sobretudo, as revelações do Espírito Santo anotadas durante suas leituras bíblicas pela madrugada - tudo isso seria empregado na composição dos artigos que sairiam de suas mãos.
     Sua missão dali para frente seria produzir uma genuína literatura pentecostal, uma fonte de onde jorrassem as cristalinas palavras ditadas pelo Espírito Santo, fundamentadas em Cristo, aprovadas pelo Senhor dos senhores.
    Sua admissão oficial como funcionário da CPAD data de 15 de março de 1940. Desde o convite do missionário Nils Kastberg até aquela data, fora apenas colaborador do Mensageiro da Paz. Daí por diante, por mais de trinta anos Emílio Conde dedicaria à CPAD seu talento, sua cultura, sua impressionante capacidade de trabalho, sua mente clara e fecunda.
     Era um homem humilde, simples. Não costumava ostentar os conhecimentos que possuía. Entre os amigos, sua palavra despretenciosa e amena, dosada pelo bom humor e pela sinceridade, descontraía a todos os que a ele se achegassem.
     Para os que se viam angustiados ou confusos, procurá-lo era encontrar nele um apoio, uma palavra amiga, esclarecida, experimentada, confortadora.
    Seu trabalho na imprensa evangélica não foi uma profissão: foi um sacerdócio. Trabalhou para levar a semente da Palavra de Deus aos corações, e nisto empregou toda a sua vida. Deu-se a si mesmo, como está em 2 Coríntios 8.5: "... mas a si mesmo se deram, primeiramente ao Senhor e depois a nós, pela vontade de Deus."
     E era tão grande seu amor por esse trabalho, que chegou a rejeitar muitas propostas de empregos extra-evangélicos, pois se os aceitasse, tornar-se-ia inepto para o desempenho da função que exercia. Agindo assim, sempre esteve à altura da posição que ocupava, e sempre pronto a cooperar com a causa das Assembleias de Deus no Brasil.
    Graças à sua maneira sóbria e digna de se conduzir, foi, entre nós, uma espécie de representante mor de nosso movimento em todos os meios sociais e evangélicos. De 1946 a 1958 representou oficialmente as Assembleias de Deus do Brasil nas Conferências Mundiais Pentecostais, havendo estado em Estocolmo, Londres e Toronto.
     E foi também, durante muitos anos, nosso representante, não só na Diretoria, mas também em Comissões da Sociedade Bíblica do Brasil.
     Quando principiou a escrever em benefício do Evangelho, eram poucos os que entre nós podiam e se prestavam a tal ofício. Portanto, foi de sua caneta que fluiu a maioria dos artigos, das notícias e das reportagens usadas no jornal O Mensageiro da Paz, nas revistas, e também nos livros da CPAD e tudo mais que ia do Sul ao Norte do Brasil para as nossas igrejas - as mensagens escritas para edificação dos fiéis.
     Seu conhecimento e sua visão espiritual abrangiam toda a comunidade evangélica brasileira. Empenhou-se a fundo em obter dados do Movimento Pentecostal no Brasil e no mundo e, como resultado, escreveu os livros: O Testemunho dos Séculos e História das Assembleias de Deus no Brasil (este último, reescrito e ampliado pela CPAD). Escreveu também os seguintes livros: Asas do Ideal, O Homem, Pentecoste para Todos, Igrejas sem Brilho, Nos Domínios da Fé, Caminhos do Mundo Antigo, Flores do meu Jardim, Tesouro de Conhecimentos Bíblicos, e Estudos da Palavra.
    Era, sobretudo, um homem de oração. Foi orando que recebeu de Deus inspiração para compor 25 hinos da Harpa Cristã, e outros, sendo dois em parceria com o missionário Nils Kastberg, e cinco com a missionária Eufrosine Kastberg. Integrou, durante muitos anos, o Coral da Assembleia de Deus em São Cristóvão, tendo sido também organista e acordeonista. Gostava muito de cantar, e todos quantos o ouviam, sentiam vibrar as cordas de seu coração, pois ele estava sempre desejando "as ruas de ouro e cristal da formosa Jerusalém".
    Considerando o imenso e relevante trabalho por ele prestado à Assembleia de Deus no Brasil, foi-lhe oferecido certa vez, por um grupo de pastores, o acesso ao Ministério do Evangelho, através de ordenação, mas ele recusou definitivamente.
     Em janeiro de 1971, acometido de uma já antiga enfermidade, oriunda de complicações pós-operatórias, foi internado no Hospital Evangélico, na Tijuca. Uma semana antes a irmã Didi, enfermeira que cuidou dele nos seus últimos meses de vida, o encontrara dormindo com a caneta entre os dedos, debruçado totalmente sobre o trabalho inacabado. Seria sua última página escrita.
     Aplicadas todas as forças da alma e do corpo para servir a Cristo, toda sua vida não lhe fora suficiente; era-lhe necessário passar para a eternidade e continuar servindo "Àquele que é mais sutil que o ar, mais ligeiro que o relâmpago, e cujo olhar é mais belo que um alvorecer de primavera, e mais suave que a claridade das estrelas".
    "Vinde ver o mais egrégio espetáculo que pode haver na terra: Vinde ver como morre um justo." A noite lentamente se apossara do hospital, e as sombras, crescendo nos recantos menos favorecidos pela claridade desmaiada e última do crepúsculo, escalaram pouco a pouco as paredes externas do edifício, e, silenciosas e irreversíveis, foram-no revestindo de uma tonalidade cinza.
      Invadindo as vidraças, penetraram no quarto de Emílio Conde, que, deitado no seu leito de morte, pesava a sua vida, o que tinha sido, o que fizera, o que deixara de fazer.
     Ele não se sentia só, pois desde o dia em que o Senhor se apossara mansamente do seu coração e nele fizera morada, sua alma nunca mais fora presa do angustioso sentimento de solidão. O "Não te deixarei, nem te desampararei" cumprira-se fielmente em sua vida.
    Às 13.00 horas do dia 5 de janeiro de 1971, Emílio Conde dormiu no Senhor. Às 17.00 horas do mesmo dia seu corpo saía do Hospital Evangélico para ser velado no Templo da Assembleia de Deus em São Cristóvão, ficando próximo ao púlpito, aquele mesmo púlpito onde pregara tantas vezes e onde tantas vezes cantara. A Rádio Nacional, a Tupi e a Globo noticiaram com detalhes o seu falecimento.
     O seu compacto "Águas Vivas" foi tocado durante toda a noite, nos intervalos dos muitos que usaram da palavra.
    Pela manhã, às 9.30 horas, chegou o Vice-Governador do Rio de Janeiro, o doutor Erasmo Martins Pedro; usando da palavra, o Vice-Governador disse que Emílio Conde em vida "fazia o trabalho do acendedor de lampiões: entrava numa rua escura e ia deixando atrás de si luz".
     Representantes de instituições batistas disseram que Emílio Conde não pertencia somente às Assembléias de Deus, mas aos evangélicos de todo o Brasil.
    O pastor Túlio Barros pediu que todos os presentes abrissem suas harpas e cantassem juntos o hino 202: "Junto ao trono de Deus preparado..." Em seguida o pastor Alcebíades Pereira de Vasconcelos leu Apocalipse 14.13, e, enquanto falava, um ancião aproximou-se lentamente do corpo e contemplou aquela face pálida e serena, transfigurada pela beleza sagrada e espiritual da morte, afastando-se mansamente depois.
     Era o irmão Adrião Nobre, um dos pioneiros da obra pentecostal no Brasil, e o membro número um de São Cristóvão.
    Às 10.00 horas, os pastores Túlio Barros Ferreira, Alcebíades P. Vasconcelos, Geziel Nunes Gomes e o irmão Catarino Varjão empunharam as alças do caixão e se dirigiram à porta de saída do templo. No cemitério do Caju, o pastor Geziel Gomes, em nome de todos os obreiros do Campo de São Cristóvão, usou da palavra, despedindo-se de Emílio Conde.
     Ao concluir, disse: "Ele não gerou filhos materiais, mas os seus filhos na fé são tantos que não se podem contar."
    Em seguida os presentes cantaram o hino: "Pensa na celestial melodia." Por último, o pastor Túlio Barros orou. A multidão se afastou deixando atrás de si, na tumba 81.011, da quadra 81-A, do Cemitério do Caju, o corpo de um justo, o homem que soube honrar a Deus e servi-lo durante toda a sua vida.

     A tudo que é transitório soubeste dar, com a tua   grave melancolia, a densidade do eterno.
Mais de uma vez fizeste aos homens advertências terríveis.
    Mas a tua glória maior é ser aquele que soube falar a Deus nos ritmos de sua Palavra.

Jefferson Magno Costa

Um comentário:

  1. Querido Pastor,

    o seu trabalho, o modo como escreve, a sua humildade é parecido com o Saudoso Pastor Emilio Conde.
    Agradeço a Deus pela sua vida e de sua familia. Apaz do Senhor!

    ResponderExcluir

.

.

Postagem em destaque

OS MAIORES FILÓSOFOS DA HUMANIDADE RECONHECEM: DEUS EXISTE!

JEFFERSON MAGNO COSTA        Ao contrário do que muitos ateus pensam, as maiores inteligências que o mundo já viu, os gênios que deixa...